tudo isto começa sempre no mesmo sítio: no interior da algibeira.
andamos normalmente pelas ruas. uns dias chove, outros dias nem tanto. e o nosso rosto ressente-se disso. mas continuamos
até ao momento em que metemos as mãos aos bolsos, para nos protegermos dos invernos escuros e rugosos:
encontramos bilhetes de autocarro ou papéis impressos em máquinas,
num determinado momento,
em que estávamos acompanhados por
uma determinada pessoa ou assoberbados por
um determinado sentimento
e volta tudo de rompante.
aí, a mente recorda aquilo que fez ou que imaginou; o peito reescreve nas veias o ritmo a que o sangue pulsava, no momento em que as paredes secas pararam os gritos
e recordo a tua pele marcada e isso queima-me as pálpebras.
a minha voz encapela-se à medida em que te quer ver, de baixo para cima, e dizer que tudo não passou de um caminho errado, de um reflexo inesperado e impossível de reviver
mas, todas as noites, essa imagem retorna aos lençóis quentes e relembra o rosto que se viu ao espelho e não se reconheceu.
podia não ter sangue em redor do olhar, podia haver silêncio e uma aparente calmia mas
afinal eu não sei sempre tudo: assim notei que o espelho não produzia reflexo
e me enclausurei.
foi a partir daí que refiz o caminho de volta. não recordo a data, não recordo o momento - sabes que a minha memória já não é o que era
e talvez por isso tente apagar dos lábios o nome das crianças por nascer,
mas mesmo assim sei-os de cor, até que me amparem o corpo
ou me façam esquecer as tuas fotografias.
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