Pesquisar neste blogue

segunda-feira, março 15, 2004

A pior prisão para o corpo é a de estar circunscrito a um quarto no qual nada há a fazer. Sei que o dia está sóbrio, apenas as palavras trazem consigo a ressaca dos dias ininterruptos. Tenho humidade presa às mãos e os gestos são maquinais e automáticos: o retrato de tudo o que deixaste. A casa é hoje uma ruína que nos apela à memória. E diziam que a felicidade era isso: apenas momentos, todos juntos. E as noites chegam umas após as outras e, ao olhar para trás, ao sentir a pele colar-se aos lençóis frios, sei que não chegarás. Já muitas vezes te vi distante, e nem mesmo assim me mexi daqui. Continuo estagnado, as mãos a desenharem círculos vazios e infantis no espaço em volta, e as palavras a trazerem dores adjacentes, enjoos matinais e o acordar repentinamente. Esse acordar súbito, com os olhos-semi-fechados-e-doentes. Nada trago comigo à excepção da infância que se me enraiza no caule da boca. O sorriso morre-me ainda nos lábios e a frescura dos gestos persegue-me de quando em vez: e apenas afastar-te os cabelos da fronte me alimenta o sonho que tenho de estar coberto, sentado na amurada das planícies, e sentir que lês as cartas que queimo sem que tu acordes.

Sem comentários: