o que dizer da paz que nos visita enquanto dormimos?
passam-se anos em que procuramos, sem saber muito bem como, algo que faça a cara esticar-se e sorrir; desvendamos ruas sem olhar as fotografias que tirámos apenas porque já são antigas
já ficaram lá atrás.
falamos coisas inúteis e incessantes sabendo que nada de profícuo nos consome: que nada eterno nos enche a carne e a pele.
sabemos mas esperamos o contrário.
e, de quando em vez, sem notarmos, algo se deita a nosso lado, muito sossegado, e geme baixinho.
durante alguns anos, não ouvimos. temos o ouvido perdido noutros nomes, temos os dedos a percorrer, sem sentirem, outra pele.
partilhamos o sexo porque mais nada sabemos fazer, naquele momento, naquele então. doamos o nome ao ocupante anónimo do nosso corpo.
e perseguimos uma voz etérea, uma sombra.
e, a dada altura, já não sabemos quem somos. olhamo-nos ao espelho, assustamo-nos: quem és tu? - dizemos a nós próprios
e rimos com a resposta.
e é então que surge uma bifurcação do espírito: arrancamos a pele deixando o coração intacto e meio cheio
ou olhamos para o lado e vemos que a pequena que descansa sabe perfeitamente como segurar as nossas mãos, sem que doa.
sorrimos porque chegaste.