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quinta-feira, abril 30, 2009

rain coat.

As meias ensopadas entorpecem os pés, juntamente com o frio da noite caída. Estão esburacadas, tal como os sapatos, por onde o peso se distribui. Levantamo-nos devagar - sim, porque as forças não chegam para tudo - e pensamos em tudo menos naquilo que nos falta porque aí a lista seria infindável.

Saímos de casa onde as paredes são de cartão. Ligação directa para a rua, para os sons perdidos das pessoas que nem sequer imaginam o que é procurar o nosso lugar sem que haja mapas para lá chegar.

procuramos alimento para o corpo, para que a pele se despegue dos ossos de modo a permitir, quiçá, espaço para outro alguém dentro de nós. É difícil porque por aqui ninguém dá nada a ninguém, muito menos ajuda.

E a ansiedade cresce e propaga-se por cada milimetro do corpo, como um choque eléctrico que nos atordoa sem magoar porque o coração, esse, está demasiadamente escondido na pouca carne que nos resta.

acendemos um cigarro. Um cigarro não, uma beata porque não há dinheiro para mais. tentamos aproveitar tudo ao máximo porque depois já não há nada. pensamos na família, nos amigos, nos conhecidos ou nos trabalhos que, em tempos, desempenhámos.

e tudo isso está tão longe já.

caminhamos devagar porque os pés estão magoados. pousamos as mãos nas algibeiras para aquecer e disfarçar o frio mas o fundo, de tão gasto, já não existe e podemos ver o chão a desaparecer, passo ante passo.

assim, torna-se inevitável perder o rumo que um dia chegámos a ter e é então que deixamos de conseguir falar porque as palavras têm sentido quando ouvidas

e o mundo é surdo demais para perceber.

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