Pesquisar neste blogue

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Um traço pelo rosto.




Um dia existiria em que as tuas mãos se perderiam pelo cansaço das horas. A recordação esbranquiçada das mulheres em torno dos rios e das crianças: o medo ensurdecedor de que a velhice nos abnegasse da sapiência: a cegueira abrupta do amor a invadir-nos os poros: nós , sem respirar , por debaixo de escombros e de trajectos apagados.
A rua parecia-nos , então , com algo que nunca se nos deparara. Assemelhava-se ao traço fundo que nos contorcia o rosto ; trazia nos seus braços a ternura própria de quem esconde a juventude por detrás das costas: as mesmas , largas , que suportavam o mundo em redor.

Depois , chegou a voz.

Nada mais houve que trouxesse o silêncio dos navios que rodeavam a cidade. A luz passou a esconder-se entre nós e os lençois. Os olhos teimavam em fechar-se e apaziguar os gritos dos filhos era tarefa àrdua: o mundo , como o conhecíamos , não passava de um local de abandono.

Por fim , esvaziámos os bolsos das coisas superflúas. Deparámo-nos com imagens antigas de despedidas e de "olás" em surdina. Tornámo-nos pesados para tantas memórias - o queixo as pálpebras os dedos as falanges a barba
e de repente a idade não é mais um obstáculo e as imagens do quarto arredondado os nomes e os gestos
não fazem mais sentido.

Sem comentários: