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segunda-feira, dezembro 29, 2003

Nada há que eu queira devolver-te. Sei que, se fosse ontem, milhentas coisas te poderiam ser restítuidas, da mesmíssima forma em que as obtive: inócuas .. metálicas. Sei que a hora já é tardia para que te consiga acordar; para que, entre a água e a lama dos meus olhos, nada mais entre a não ser o teu corpo desnudado. Já lá vão alguns dias desde a última vez em que não nos encontrámos, e de mim tenho a ténue imagem de resignação . de silêncio. Assim te tive. Assim é a forma como te vou lembrar, de ora em diante: leve ausente quase-minha.
E de nada vale relembrar-te o dia que é hoje. Mas talvez, ao nascer de novo, daqui a alguns dias, talvez assim seja suficiente para que retornes a uma casa que o deixou de ser, há muito, desde o momento em que te não foi suficiente. E hoje lembranças retornam-lhe à fronte, das paredes saem gotas de suor e de vozes que um dia tiveste nos teus lábios - que nada diziam, então. É como hoje, em que nada sai como seria suposto: existe calor em formas diversas, mas o corpo é uma moldura de tudo aquilo que não quiseste lembrar. Sussurro-te, de longe, hoje: nada mais resta por aqui.
E conseguiste ouvir-me, não sei como, a dizer-te tudo aquilo que irias conhecer no futuro, e foi ontem que partiste - não conto mais as horas desde então. Crescem-me cabelos brancos rente à pele, a mesma onde um dia conseguiste adormecer - lembras? era-te díficil adormecer, sei que eu estava pela casa toda, a guardar-te, tu de rosto cansado, o corpo arqueado por debaixo dos lençóis, de braços cruzados, a proteger a face, como um espelho onde ninguém conseguiria ver-te. Talvez seja esta a forma como te tenho, hoje, mesmo que aqui não estejas desde o momento em que partiste - mas de ti resta-me apenas o teu cansaço, que uma vez consegui guardar.

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